quarta-feira, 17 de julho de 2013

As mães da Síria VI


Mário Rita

Onde estão as tuas sete portas com ninhos de pombas brancas
Dá-me o perfume da flor de laranjeira

Quero molhar o rosto nas águas das tuas fontes
Recolher-me na Grande Mesquita com os peregrinos pobres
Acenar-te com um lenço branco depois de morrer

Ser tua cidadã
Na raiz das oliveiras que deram o azeite
Mais antigo do mundo

O azeite não curou as minhas chagas
Dá-me o chá da folha de laranjeira
O licor de anis
Para me sedar

Ouvi os frutos das romãzeiras
Entoar salmos
As amendoeiras sobrevoaram os céus
Transfiguradas em morteiros

Dá-me a lua eterna das mil e uma noites
Cidade das ruínas do presente
Deixa-me morrer

Bordei o cetim para o vestido de noiva da minha filha
Com os meus dedos dourados
Agora peço-te que me cubras com um véu de noite
Que traga o esquecimento
O passado foi o teu esplendor
Uma rosa-dos-ventos desorientada indicou os
Caminhos da guerra

Quantos mortos nos teus túmulos
Jazidos ao ar livre

A um jarrinho de azeite confiei a minha última esperança

Era doce o rosto da minha filha num casamento
De felicidade

Talvez um vento áspero vindo do deserto
Transporte o meu coração para um mais além
Onde jejuarei para sempre

Cidade do mundo a mais antiga
Neste princípio escaldante de Julho
Morrerei numa perpétua aliança
Aos astros e aos planetas  

Quero ser uma árvore queimada nesta tempestade
Que a todos mata
Desde as formigas aos confins do género humano
Tudo é alquimia de sofrimento

Pão do sangue do cordeiro
Amassado com sal insano

Tudo é chama infernal que não saberei quando cessa